sábado, 5 de fevereiro de 2011

Ao amigo que parte

Eu lembro bem do cara magrelo numa das minhas primeiras turmas como professor substituto na UFPE. Boas impressões precediam aquela turma, havia alunos muito interessados, promessas que se cumpririam anos depois. Nela eu encontrei minha esposa, Julia, que me deu o Francisco, poema que o movimento da vida vai tratar de dar forma, e encontrei também um amigo.

Diria até que encontrei o amigo primeiro - só começamos a namorar Julia e eu um tempo depois, quando já não era professor dela (a mais pura verdade!). Tinha terminado um relacionamento malogrado de oito anos, a vida vazia e com um gosto meio amargo de dor que dura mais do que deveria. E lá estava o amigo, embora ele não soubesse ainda que seria amigo: "Você conhece o Suede, não acredito. Finalmente encontrei alguém que gosta do Suede!" As afinidades musicais foram se somando às afinidades literárias. De tal modo essas afinidades cresceram que eu o convidei a fazer parte do meu projeto mais querido - a revista Crispim, em que já estavam Eduardo Maia e Artur de Ataíde. Logo, transformou-se num dos primeiros leitores de meus poemas. Nunca lembro de Cristhiano como aluno, sempre como amigo. Amizade, pra mim, é como a graça protestante, sem justificativa, sem fundamento, diria até sem racionalização. Gosta-se, e ponto... Não tenho como expressar o quanto esse cara deu à revista e aos seus amigos. Seu olhar inteligente e seu trato amigável fizeram até de seus erros mais graves algo desculpável. Mesmo as chateações que tive com ele num período em que nos afastamos um pouco (ele seguindo o seu caminho, independente, livre, qualidade sua e das pessoas capazes de agarrar a vida pelos chifres), não impediram de que perto de sua partida para São Paulo eu sentisse esse novo contexto como perda, uma sentida perda.

Certa vez um amigo me disse que os pássaros que migram não são os mesmos que voltam. Ele se referia ao efeito das distâncias sobre as relações das pessoas. Sei que algo sempre se perde, mas algo sempre permanece. Sinal disso é o sentimento dessa partida como uma dor discreta e contida. A dor pelo amigo que te ajudou a desenhar uma parte de tua vida, mesmo que não esteja completamente ciente disso. E alegria: vai lá ele abrir novos caminhos, de quem se lança feito albatroz (cai bem com ele essa imagem) no voo sempre súbito da novidade.

E, se possível, leva mais um amigo nesse peito estreito, que agora já respira os ares de sampa.

O abraço fraterno de teu amigo
Fábio

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